TEMA: Os valores e as ações humanas
“Sêneca viveu em Roma no período denominado
Helenismo, datado entre o século IV a.C. até III d.C. Sabe-se que Sêneca foi um
dos principais filósofos estóicos do mundo latino e o Estoicismo uma escola
filosófica que teve uma longa trajetória histórica. Diz-nos Sêneca:
Devemos igualmente mostrar
docilidade e não ser escravos demais das resoluções que tomamos; ceder de boa
vontade à pressão das circunstâncias e não temer mudar, seja de resolução, seja
de atitude, contanto que não caiamos na versatilidade, que é de todos os
caprichos o mais prejudicial à nossa tranquilidade. Porque se a obstinação é
inevitavelmente inquieta e deplorável, visto que a fortuna lhe arranca a todo
momento qualquer coisa, a leviandade é ainda muito mais penosa, porque ela não
se fixa em nada. Estes dois excessos são funestos à tranquilidade da alma:
recusar-se a toda alteração e nada suportar. (SÊNECA. Da tranquilidade da alma.
São Paulo: Abril Cultural, 1973)
Para entender melhor o que nos
diz Sêneca é bom esclarecer o que seja fortuna e versatilidade. Fortuna é uma
divindade romana responsável pela sorte, pelo acaso e pelo imprevisto. Os
gregos a chamavam de Tique. Para a filosofia adota-se o termo acaso. O acaso é
para os estóicos um erro ou ilusão, pois entendiam que tudo acontecia no mundo
por necessidade racional. Portanto, para os estóicos em tudo o que acontece há
uma razão, pois nada é visto como acaso.
Observe que entre nós é comum o
entendimento da fortuna como sinônimo de sorte. É bom destacar que para Sêneca
o conceito de fortuna e acaso são distintos e claro que também para os demais
filósofos, sobretudo os modernos e contemporâneos.
O outro conceito que precisamos
esclarecer é o de versatilidade. Observe que no texto de Sêneca possui um
caráter negativo, ao passo que para nós a versatilidade é algo positivo. Cada
vez mais se defende a necessidade de sermos versáteis. No caso do texto de
Sêneca podemos substituir o termo versátil por volúvel e assim nos aproximarmos
mais da ideia que Sêneca quer nos passar.
Você pôde observar que a
recomendação chave de Sêneca está em ‘ceder de boa vontade a pressão das
circunstâncias e não temer mudar’. É interessante que Sêneca pressupõe a
tranquilidade diante do mundo que nos cerca. É preciso para isso nem cair em
obstinação, nem em leviandade.
É preciso lembrar que o momento
histórico em que viveu Sêneca foi um momento de ruína do Império Romano. O
Império Romano estava em decadência e cada dia mais isso era perceptível aos
olhos daqueles que viviam aquele momento, sobretudo os pensadores da época. É
nesse contexto de ruína, decadência, que a proposição de Sêneca, uma ética
individualista, ou seja, centrada no indivíduo pode ser entendida e explicada.
O que é comum ocorrer com as
pessoas em momentos de crises profundas? É a dúvida em relação ao que fazer
para sobreviver a ela. E diante de tal dúvida é comum o isolamento e a falta de
um ponto de referência que seja claro e que garanta tranquilidade. É comum
também as pessoas se angustiarem e passarem a ser atacadas de sentimentos de
medo e insegurança. Então o que Sêneca está procurando oferecer aos seus
contemporâneos nada mais é que uma forma de encararem a realidade que os cerca,
ou seja, a decadência que ameaça o mundo em que habitam e diante da qual não
possuem mais nenhuma certeza.
É claro que para atingir o estado
de espírito que Sêneca pressupõe o uso da razão é fundamental, ou seja, o sábio
é quem irá conseguir se sobressair diante das vicissitudes.
Um tirano ameaçava o filósofo
Teodoro de mandar matá-lo e mesmo privá-lo da sepultura: ‘Tu podes’, disse-lhe
este, ‘dar-te este prazer: existem aí 2,7 decilitros de sangue, sobre os quais
tens todos os direitos; quanto à sepultura, és estranhamente ingênuo, se crês
que me aflijo por apodrecer sobre ou debaixo da terra’.
O exemplo acima demonstra uma
pessoa que conseguiu chegar a um estágio de controle de suas paixões e emoções
de tal forma que assim consegue superar as dificuldades com mais facilidade.
Não se pode ignorar que esta capacidade esteja ligada a dimensão racional
humana, uma vez que graças à mesma somos capazes de perceber o que nos ameaça.”
Atividade
1. É possível ser virtuoso em
nossos dias seguindo os preceitos de Sêneca? Justifique.
2. A partir do que foi estudado
do pensamento de Sêneca, o que devemos fazer para sermos felizes? Escreva um
texto sobre o tema (mínimo de 10 linhas) levando em consideração nosso contexto
atual de confinamento devido a uma pandemia – ou seja, um evento externo que
pode nos afligir e demanda uma atitude interna e individual.
3. A partir da leitura do texto acima defina o
ideal de sábio presente na filosofia de Sêneca